Denúncias e dados alarmantes marcam audiência sobre a Atenção Primária na Câmara
Na noite desta quinta-feira (27), a Câmara de Viçosa realizou uma Audiência Pública para discutir a situação da Atenção Primária à Saúde (APS) no município e avaliar propostas para aprimorar o atendimento nas Unidades Básicas de Saúde. A iniciativa foi conduzida pela vereadora Maria Prisca (PT) e teve como objetivo esclarecer denúncias apresentadas por profissionais e usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), além de construir encaminhamentos capazes de fortalecer a política pública de saúde de Viçosa.
Compuseram a Mesa Diretora a secretária-adjunta de Saúde, Vanessa Amaral; a médica da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Mirian Santana Barbosa; o enfermeiro e pesquisador da UFV, Tiago Ricardo Moreira; o médico da UFV, Marcelo Siqueira; o enfermeiro Marcos Antônio Garcia; e a coordenadora da Atenção Primária, Viviana Moura. O vereador Omar Gilson (UNIÃO) também participou do debate.
O encontro foi motivado por uma série de denúncias envolvendo dificuldades na solicitação de exames, devolução automática de pedidos pela regulação, cotas insuficientes de ultrassonografias, atrasos expressivos nas filas de espera, baixa resolutividade das equipes e precarização dos vínculos profissionais. Segundo relatos apresentados à Câmara, esses problemas têm afetado diretamente a população, que enfrenta demora em diagnósticos, perda de documentos e falta de continuidade no acompanhamento clínico.
Durante a audiência, o enfermeiro Tiago Moreira apresentou dados compilados a partir de sistemas oficiais do Ministério da Saúde e de levantamentos realizados junto aos trabalhadores das unidades. De acordo com o pesquisador, Viçosa conta hoje com 20 equipes de Atenção Primária, quando o recomendado, considerando a população estimada, seria pelo menos o dobro. Ele destacou ainda que apenas 31% das gestantes do município realizaram as seis consultas mínimas de pré-natal e que somente 28% dos pacientes diabéticos tiveram hemoglobina glicada aferida nos últimos seis meses. Para Tiago, a baixa resolução da APS tem impacto direto nas internações hospitalares, já que cerca de 30% delas poderiam ser evitadas com um atendimento básico estruturado, contínuo e territorializado.
A médica da UFV, Mirian Santana Barbosa, enfatizou que a falta de profissionais especializados é uma das principais dificuldades enfrentadas pelo município. Segundo ela, apenas três médicos das equipes atuais possuem formação em Medicina de Família e Comunidade, especialidade considerada essencial para garantir a efetividade da Atenção Básica. Mirian alertou ainda que a ausência de formação específica compromete diagnósticos, gera excesso de encaminhamentos e amplia o número de exames solicitados sem necessidade clínica. A médica defendeu que futuros processos seletivos e concursos públicos priorizem profissionais qualificados, valorizando a especialização e a atuação na APS.
Os relatos dos usuários reforçaram a gravidade do cenário. Moradores relataram perda de exames, cobranças indevidas, atrasos em análises laboratoriais e dificuldade para obter retorno clínico. Nesse sentido, a secretária-adjunta de Saúde, Vanessa Amaral, reconheceu os problemas apresentados e afirmou que a Prefeitura está trabalhando para corrigir as distorções. Segundo ela, a territorialização atual está defasada e passa por revisão para redistribuir as equipes de forma mais eficiente. Vanessa também ressaltou que a secretaria está elaborando protocolos assistenciais e reforçando o processo de capacitação contínua dos trabalhadores da rede.
O vereador Omar Gilson (UNIÃO) destacou a importância de tornar os critérios da regulação mais transparentes e compreensíveis para o cidadão, argumentando que a falta de informação agrava a sensação de desassistência dos usuários. Ele ressaltou que a melhoria da Atenção Primária depende de prioridade política e cobrou mais investimentos na estrutura básica para reduzir o fluxo excessivo de pacientes nos serviços hospitalares e de urgência.
O enfermeiro Marcos Garcia destacou em sua fala a importância de reconhecer tanto os avanços conquistados pelo SUS quanto suas fragilidades. Ele lembrou que, apesar dos desafios estruturais e da necessidade urgente de investimento e reorganização, o SUS permanece como um dos maiores e mais sólidos sistemas públicos de saúde do mundo, referência internacional em vacinação, transplantes e vigilância em saúde. Para Marcos, fortalecer o financiamento, ampliar a participação social e garantir transparência no uso dos recursos públicos são passos essenciais para aprimorar o atendimento no município. O profissional também fez questão de agradecer e valorizar o trabalho dos servidores da rede, especialmente agentes comunitários, técnicos e enfermeiros, que sustentam diariamente o funcionamento das unidades básicas.
Ao final da audiência, a vereadora Maria Prisca agradeceu a participação das instituições e dos cidadãos, afirmando que o compromisso da Casa é acompanhar de perto os encaminhamentos e garantir que as demandas apresentadas se transformem em medidas concretas. Para ela, fortalecer a Atenção Primária é fundamental para reorganizar a rede de saúde e assegurar que a população seja atendida com dignidade, qualidade e continuidade do cuidado.
Foto: Divulgação/Câmara de Viçosa